20 – Filosofia da estética e da arte:
20.1 – Criatividade:
20.1.1 – Conceitos:
· Criar + atividade = atividade criadora. Qualidade de criador. A criatividade pressupõe um sujeito criador e imaginativo e envolve processos complexos.
· Imaginar – é uma forma de inventar ou criar um produto.
· Criativas – são pessoas que têm alguma habilidade especial e que fazem uso criativo da mesma. São inventivas, fecundas e capazes de inventar.
· Criar – dar existência, gerar, tirar do nada, inventar, produzir, cultivar, fundar, instituir, transformar, educar.
· Criador – autor, inventor, cuidador, educador.
20.1.2 – Critérios para determinar a criatividade:
· Quanto mais uma idéia ou um objeto contribuir, revolucionar ou remexer com nossas crenças e com nosso universo do saber, mais criativos eles serão. A novidade deve ser inovadora.
· A obra verdadeiramente criativa traz algum tipo de novidade que nos obriga a rever o que já conhecíamos, dando-lhe uma nova organização. “Nossa, nunca tinha percebido isso!”.
· Tudo que é criativo é novo, mas nem tudo o que é novo é criativo. A inovação aparece com relação a um dado problema com soluções e esclarecimentos. Surge geralmente do remanejo do conhecimento existente que revela insuspeitados parentescos ou semelhanças.
· Exemplo: Gutenberg resolveu o problema da impressão ao ver uma prensa de uvas para fazer vinho. Aparentemente, uvas e vinho, de um lado, e papel e letra, de outro, nada tinham em comum, e no entanto foi a partir do procedimento para fazer vinho que ele pensou em pressionar papel contra tipos molhados de tinta.
· Portanto, um ato, uma idéia ou um produto é criativo quando é novo, adequado e abrangente.
20.1.3 – Criatividade como capacidade humana:
· A criatividade é uma capacidade humana que não fica confinada no território das artes, mas também é necessária à ciência e à vida em geral.
· A ciência não poderia progredir sem os espíritos mais criativos que perceberam as relações entre fatos aparentemente desconexos e que testaram suas hipóteses e que os levaram a novas teorias para explicar os fenômenos.
20.1.4 – Imaginação:
· O processo de trabalho do cientista aproxima-se do processo de trabalho do artista. Ambos desenvolvem um tipo de comportamento denominado “exploratório”, isto e, dedicam-se a “explorar” as possibilidades, “o que poderia ser”, em vez de se deter no que realmente é. Para isso, necessitam da imaginação.
· Imaginar é a capacidade de ver além do imediato, de criar possibilidades novas e de responder à pergunta: “Se não fosse assim, como poderia ser?”.
· Este é o chamado pensamento divergente, que leva a muitas respostas possíveis.
· Tanto o artista quanto o cientista têm de ser suficientemente flexíveis para sair do seguro, do conhecido, do imediato, e assumir os riscos ao propor o novo, o possível.
20.1.5 – Inspiração:
· É o resultado de um processo de fusão de idéias efetuado no nosso subconsciente quando diante de um problema que requeira solução.
· Fazendo uma espécie de jogo associativo entre os vários elementos, iniciam-se as tentativas de “montar o quebra-cabeça” até chegar a um resultado adequado.
· A imaginação é ativada para propor todas as possibilidades e dessa “tempestade de idéias” surge em nossa consciência, sínteses e novas configurações dos dados.
· Ao surgimento dessas sínteses em nossa consciência damos o nome de inspiração.
20.1.6 – Desenvolvimento e repressão da criatividade:
· A criatividade pode ser estimulada, desenvolvida ou reprimida. Um meio ambiente favorável vai ajudar nesse desenvolvimento.
· A criatividade não é um dom que uns têm e outros não. É uma capacidade que todos nós podemos desenvolver se nos dispusermos a praticar alguns tipos de comportamentos específicos.
EXERCÍCIO PARA CASA:
144) Quando podemos dizer que uma pessoa é criativa?
145) Em que sentido a novidade é uma das características da obra criativa?
146) A criatividade diz respeito somente às atividades artísticas? Por quê?
147) Qual é o papel da imaginação?
148) O que é a inspiração?
149) Como pode ser desenvolvida a criatividade?
150) Como pode ser reprimida a criatividade?
20.2 – Estética:
· Como adjetivo serve para analisar a qualidade de alguma coisa.
· Como substantivo serve para analisar o estilo de alguma coisa.
· Como Filosofia, aparece ligada à noção de beleza e por causa disso a ARTE vai ocupar um lugar privilegiado na reflexão estética.
20.2.1 – Etimologia da palavra:
· Estética vem do grego “AISTHESES” (faculdade de sentir, compreensão pelos sentidos, percepção totalizante).
· Enquanto disciplina filosófica, a estética também está voltada para as teorias da criação e percepção artísticas.
20.2.2 – O belo e o feio: uma questão do gosto?
· O que é beleza? Será possível defini-la objetivamente ou será uma noção eminentemente subjetiva?
· De Platão ao Classicismo, os filósofos tentaram fundamentar a objetividade da arte e da beleza. Para Platão, a beleza é a única idéia que resplandece no mundo. Somos obrigados a admitir a existência do “belo em si” independente das obras individuais que, na medida do possível, devem se aproximar desse ideal universal.
· O Classicismo deduz regras para o fazer artístico a partir desse belo ideal, fundando a estética normativa. É o objeto que passa a ter qualidades que o tornam mais ou menos agradável, independente do sujeito que as percebe.
· David Hume, e a polêmica posição dos filósofos empiristas relativizou a beleza ao gosto de cada um. Neste caso, tudo o que depende do gosto e da opinião pessoal não pode ser discutido racionalmente. O belo não está no objeto, mas nas condições de recepção do sujeito.
· Kant tentou superar essa dualidade OBJETIVIDADE X SUBJETIVIDADE, afirmando que o belo é aquilo que agrada universalmente, ainda que não se possa justificá-lo intelectualmente. O objeto belo é uma ocasião de prazer, cuja causa reside no sujeito. Logo, o princípio do juízo estético é o sentimento do sujeito e não o conceito do objeto.
· A possibilidade de universalização desse juízo subjetivo só é possível na medida em que as condições subjetivas da faculdade de julgar sejam as mesmas em todos os homens.
· Belo portanto, é uma qualidade que atribuímos aos objetos para exprimir um certo estado da nossa subjetividade. Sendo assim, não há uma idéia de belo nem pode haver regras para produzi-lo. Há objetos belos, modelos exemplares e inimitáveis.
· Hegel introduz o conceito de história ao afirmar que a beleza muda de face e de aspecto através dos tempos. O devir que se reflete na arte depende mais da cultura e da visão de mundo vigente do que de uma exigência interna do belo.
· Edmund Husserl. Para a Fenomenologia, o belo é uma qualidade de certos objetos singulares que nos são dados à percepção. A beleza é a imanência total de um sentido ao sensível. O objeto é belo porque realiza o seu destino, é autêntico, é verdadeiramente segundo o seu modo de ser, isto é, um objeto singular, sensível, que carrega um significado que só pode ser percebido na experiência estética. Cada objeto singular estabelece seu próprio tipo de beleza.
· O problema do feio está implícito nas colocações que são feitas sobre o belo. O feio não podia ser objeto de arte e foi banido do território artístico desde a Antiguidade até a Idade Média. Já no século XIX, ele foi reabilitado no momento em que a arte rompeu com a idéia de ser “cópia” do real e passou a ser considerada criação autônoma com a função de revelar as possibilidades do real, passando a ser avaliada de acordo com a autenticidade da sua proposta e com sua capacidade de falar ao sentimento.
· O problema do belo e feio foi deslocado do assunto para o modo de representação. Obras feias seriam as Obras mal feitas e que não correspondessem plenamente à sua proposta. Neste sentido a obra não seria de arte.
· A subjetividade refere-se mais a si mesma do que ao mundo dentro do qual ela se forma, e esse tipo de julgamento estético decide o que nós preferimos em virtude do que somos.
· A subjetividade em relação ao objeto estético precisa estar mais interessada em conhecer, entregando-se às particularidades de cada objeto, do que em preferir. Logo gosto é ter capacidade de julgamento sem preconceitos. A própria presença da obra de arte “convida” a subjetividade a se constituir como olhar puro, livre abertura para o objeto, e o conteúdo particular a se pôr a serviço da compreensão em lugar de ofuscá-la fazendo prevalecer as suas inclinações.
· À medida que o sujeito exerce a aptidão de se abrir, desenvolve a aptidão de compreender e de penetrar no mundo aberto pela obra. Gosto é a comunicação com a obra para além de todo saber e de toda técnica.
· É através da via da universalidade do julgamento do gosto que se pode fazer justiça ao objeto estético.
20.2.3 – A recepção estética:
· A atitude estética propicia a experiência estética em face de uma obra de arte. Essa experiência é gratuita e desinteressada, pois não visa o conhecimento lógico, a ação imediata e não pode ser julgada em temos de utilidade.
· A experiência estética é a experiência da presença tanto do objeto estético como do sujeito que o percebe.
· A obra de arte pede uma recepção que lhe faça justiça, que se abra para ela, sem lhe impor normas externas com a finalidade de um desvelamento constituinte do objeto através de um sentimento que o acolhe e que lhe é solidário.
· A obra de arte espera que o público “jogue o seu jogo”, entre no seu mundo de acordo com as regras ditadas pela própria obra para que seus múltiplos sentidos possam aparecer.
· O espectador, através do seu acolhimento, atualiza as possibilidades de significado da arte e testemunha o surgimento de algumas significações contidas na obra. Todos igualmente verdadeiros.
EXERCÍCIO PARA CASA:
151) Quais são os significados da palavra estética no uso comum, na arte e na filosofia?
152) Por que a estética está ligada à arte?
153) O que é beleza como valor objetivo?
154) O que é beleza como valor subjetivo?
155) Como Kant supera a dualidade objetivo-subjetivo do belo?
156) Qual é a importância do conceito de história introduzido por Hegel?
157) Como se coloca o problema do belo do ponto de vista da fenomenologia?
158) Como pode ser representado o feio?
159) Por que não há obra de arte quando o modo de representação é feio?
160) O que é ter gosto?
20.2.4 – Estética: breve histórico:
20.2.4.1 – O naturalismo:
· O conceito de belo é eminentemente histórico.
· Naturalismo é a postura fundamental que marcou profundamente toda a arte ocidental desde a Grécia Antiga até sua ruptura no final do século XIX, a qual deu origem à produção artística do século XX.
· Naturalismo pode ser definido como a ambição de colocar diante do observador uma semelhança convincente das aparências reais das coisas.
· Podemos distinguir algumas variações. As mais importantes são o REALISMO e o IDEALISMO.
· O REALISMO mostra o mundo como ele é, nem melhor, nem pior. É característico, por exemplo, da arte renascentista do século XV.
· O IDEALISMO retrata o mundo nas suas condições mais favoráveis, como desejaríamos que fosse e aperfeiçoando o real. É o padrão da arte dos gregos que elaboraram a teoria das proporções do corpo humano.
20.2.4.2 – O naturalismo grego e renascentista:
· Na Grécia Antiga não havia a idéia de artista como temos em nossos dias, pois as obras de arte dessa época eram utensílios como vasos, ânforas, copos, templos, etc. ou instrumentos educacionais.
· O artífice era um artesão numa sociedade em que o trabalho manual era considerado indigno.
· Essa atitude perante a arte está fundada sobre o conceito grego “mímesis” (imitação). Para Platão as palavras “imitam” a realidade e neste caso, a tradução correta para “mímesis” seria representar e não imitar.
· Para Aristóteles a arte “imita” a natureza e engloba todos os ofícios manuais, indo da agricultura ao que hoje chamamos de belas-artes. Assim, a arte, enquanto “poíesis”, ou seja, “construção”, “criação a partir do nada”, “passagem do não ser ao ser”, imita a natureza no ato de criar. Por outro lado, também aqui poderíamos entender “mímesis” com o sentido de “representar”. Para Aristóteles, todos os ofícios manuais e toda a educação completam o que a natureza não terminou.
· Aristóteles afirmou que a apreciação da arte vem do prazer intelectual de reconhecer a coisa representada através da imagem. Assim, ele resolveu o problema do feio. O prazer, no caso, não vem do reconhecimento da coisa feia mas da habilidade que o artista demonstra ao representá-la.
· Platão distingue a poesia mimética, na qual as personagens falam por si, da poesia narrativa.
· Aristóteles, no Capítulo III da Poética, enumerou três métodos de “mímesis” na poesia:
Ø O primeiro é a poesia narrativa, sem personificação;
Ø O segundo é a poesia dramática, com personificação;
Ø O terceiro é uma mescla dos dois anteriores, com narrativa e personificação.
· É no sentido de cópia ou reprodução exata e fiel que a palavra “mímesis’ passou a ser adotada pela teoria naturalista.
· Santo Tomás de Aquino retoma o pensamento de Aristóteles e recupera o mundo sensível que havia sido considerado fonte de pecado durante quase toda a Idade Média.
· Santo Tomás afirmou que a beleza é um dos aspectos do bem e que a beleza e a bondade de uma coisa são fundamentalmente idênticas, pois a beleza é o aspecto agradável da bondade, pois o belo é agradável à cognição.
· O Renascimento artístico, ocorrido entre os séculos XIV e XV na Europa, passa a dignificar o trabalho do artista ao elevá-lo à condição de trabalho intelectual. Consequentemente, a obra de arte assume um outro lugar na cultura da época. Neste contexto, as artes buscaram um naturalismo crescente, mantendo estreita relação com a ciência empírica que despontava na época e fazendo uso de todas as suas descobertas e elaborações em busca do ilusionismo visual.
· Osborne distingue seis princípios fundamentais que dominaram o ponto de vista renascentista no terreno da estética:
1. A arte é um ramo do conhecimento e, portanto, criação da inteligência;
2. A arte imita a natureza com a ajuda das ciências;
3. As artes plásticas e a literatura têm propósito de melhoria social e moral, aspirando ao ideal;
4. A beleza é uma propriedade objetiva das coisas e consiste em: ordem, harmonia, proporção e adequação. A harmonia expressa-se matematicamente;
5. as artes alcançaram a perfeição na Antiguidade Clássica, que deve ser estudada;
6. As artes estão sujeitas a regras de perfeição racionalmente apreensíveis que podem ser formuladas e ensinadas com precisão. Aprendemo-las pelo estudo das obras da Antiguidade.
· Posteriormente, esses princípios foram reduzidos a um sistema, dando origem ao ACADEMISMO, isto é, ao classicismo ensinado pelas academias de arte. É a chamada estética normativa, que estabelece regras para o fazer artístico, acabando com a criatividade e a individualidade da intuição artística. É filha do intelectualismo iluminista do século XVII.
20.2.4.3 – A ruptura do naturalismo:
· A revolução estética, cujas raízes estão no século XVIII na Inglaterra, foi completada nos últimos cem anos, quando a apreciação estética passou a ser o único valor das obras de arte.
· André Malraux, crítico francês afirmou: “A Idade Média tinha tanta noção do que entendemos pelo termo arte quanto a Grécia ou o Egito, que careciam de uma palavra para exprimi-lo. Para que essa idéia pudesse nascer, foi preciso que se separassem as obras de arte de sua função (...). A metamorfose mais profunda principiou quando a arte já não tinha outra finalidade senão ela mesma”.
· A produção artística do século XX caracteriza-se por uma arte independente tanto da intenção do autor, quanto dos valores propósitos não propriamente estéticos. A arte não mais representa naturalisticamente o mundo, não promove valores sociais, morais, religiosos ou políticos, mas torna-se promotora da experiência estética.
· Neste momento surge o repúdio à estética sistemática e certo ceticismo quanto às possibilidades de definição da beleza.
· Influenciados por Ludwig Wittegenstein, os Filósofos da linguagem, passaram a partir da década de 30 a procurar o significado de termos gerais como arte e beleza no território lingüístico.
· Essa nova atitude estética advém do estado de espírito cautelosos, empírico e analítico que não quer generalizar, mas se manter atento às características individuais de cada arte, possibilitando a cada uma empreender experimentações.
· Com a dissolução da atitude naturalista, os artistas passaram a menosprezar o assunto ou tema das suas obras para valorizar o fazer a obra de arte. Qualquer assunto servia, ou mesmo nenhum assunto, como é o caso da arte abstrata e da música atonal.
· A obra de arte adquire um estatuto próprio de obra sem a função de representar nenhum aspecto da realidade exterior, pois ela é a própria realidade. Realidade de obra de arte.
· Apesar dessa ruptura, a postura naturalista continuou a predominar em outros campos, principalmente nos meios de comunicação de massa, como TV, cinema e rádio. Toda programação televisiva tem por objetivo criar uma ilusão da realidade.
· Por exemplo: Ao selecionar as imagens que vão se mostradas, ao cortá-las, ao montá-las numa determinada ordem (edição da matéria), a produção do telejornal já mutilou a realidade, já a interpretou e nos mostra o produto final manipulado como se fosse o fato em si. É o naturalismo a serviço da ideologia dominante.
EXERCÍCIO PARA CASA:
161) O que é naturalismo?
162) Como se caracterizam o realismo e o idealismo?
163) Quando se dá a ruptura com o naturalismo?
164) Qual é a função da arte na Grécia Antiga?
165) Como o conceito de mímesis vai dar origem ao naturalismo?
166) Como são avaliadas as obras de arte dentro da perspectiva naturalista?
167) Como a ciência colabora com o naturalismo artístico?
168) Quais são os princípios da estética renascentista?.
169) O que é o academismo?
170) Qual é a finalidade da arte no século XX?
20.3 – Arte como forma de pensamento:
20.3.1 – Arte é conhecimento intuitivo do mundo:
· A arte apareceu no mundo humano como forma de organização e como modo de transformar a experiência vivida em objeto de conhecimento através do sentimento.
· A arte é um caso privilegiado de entendimento intuitivo do mundo, tanto para o artista que cria obras concretas e singulares quanto para o apreciador que se entrega a elas para penetrar-lhes o sentido.
· Todo artista percebe pelo poder seletivo e interpretativo dos seus sentidos, formas que não podem ser nomeadas e ou reduzidas a um discurso verbal explicativo, pois elas precisam ser sentidas e não explicadas. A partir dessa intuição, o artista não cria mais cópias da natureza mas, sim, símbolos dessa mesma natureza e da vida humana.
· Esses símbolos são obras de arte, objetos sensíveis, concretos, individuais, que representam analogicamente, ou seja, por semelhança de forma a experiência vital intuída pelo artista.
· Exemplo: A tela de Mondrian intitulada New York não reproduz figurativamente, iconicamente, a cidade, mas representa analogicamente a vivência do artista em relação a ela. Essa apreensão do concreto, do imediato, do vivido, é transportada para uma outra obra que também é um objeto concreto para o espectador.
· Quando apreciamos uma obra de arte, fazemo-lo através dos nossos cinco sentidos.
· A partir dessa percepção sensível podemos intuir a vivência que o artista expressou em sua obra, uma visão nova, uma interpretação nova da natureza e da vida. O artista atribui significados ao mundo por meio da sua obra. O espectador lê esses significados nela depositados. Essa interpretação só é possível em termos de intuição e forma sensível.
· Na obra de arte o importante não é o tema em si, mas o tratamento que se dá ao tema, que o transforma em símbolo de valores de uma determinada época.
· Luz, cor, volume, peso e espaço enquanto dados sensíveis são usados para alargar o horizonte de nossa experiência sensível.
· O artista não copia o que é; antes cria o que poderia ser e, com isso, abre as portas da imaginação.
20.4 – O papel da imaginação na arte:
· Imaginação serve de mediador entre o vivido e o pensado, entre a presença bruta do objeto e a representação, entre a acolhida dada pelos órgãos dos sentidos (corpo) e a ordenação do espírito (pensamento analógico).
20.5 – Arte e sentimento:
· Na experiência estética, a imaginação manifesta o acordo entre a natureza e o sujeito numa comunhão via sentimento que acolhe o objeto, reunindo as potencialidades do eu numa imagem singular. Esse sentimento despertado não é o sentimento de uma obra, mas de um mundo que se descortina em toda sua profundidade, no momento em que extraímos o objeto do seu contexto natural e o ligamos a um horizonte interior.
· A emoção é uma resposta e uma maneira de lidarmos com o sentimento.
· O sentimento é conhecimento porque esclarece motivando a emoção. É irrefletido e supõe uma certa disponibilidade para acolher o afetivo. Neste sentido o sentimento alcança, para além da aparência do objeto, a expressão que é o poder de emitir signos e de exteriorizar uma interioridade, isto é, de manifestar o que o objeto é para si. Em arte essa expressão é sempre feita por um meio específico como vídeo, pintura, dança, etc.
· O projeto do artista condiciona o meio e o material, que, por sua vez, condicionam as técnicas e o estilo. Tudo isso reunido forma a linguagem da obra, sua marca inconfundível, seu significado sensível.
20.6 – A educação em arte:
· A educação em arte só pode propor um caminho: o da convivência com as obras de arte que encontram-se em museus, galerias, praças públicas, bancos, repartições do governo, casas de amigos, vitrines de lojas, feiras de artesanato, cinemas, teatros, televisão, rádios, edifícios, jardins, túmulos, etc. É preciso uma determinada intenção de procurá-las e de percebê-las.
· Apenas através desse contato aberto e eclético que podemos afinar a nossa sensibilidade para as nuances e sutilezas de cada obra, sem querer impor-lhe o nosso subjetivismo marcado historicamente pela época, lugar e classe social a que pertencemos.
· É na freqüência da obra que a intersubjetividade pode promover através de veredas não racionais da arte, sintonia e encontros com o autor, sua época e também com seus contemporâneos. É a arte nos unindo numa comunhão intuitiva que nos irmana.
· É necessário aprender a sentir a arte sem desprezar a racionalidade numa emoção descabelada. Não é apenas fazer uma catarse das nossas emoções como o chorar durante uma ópera. A emoção deve ser despida de seu conteúdo material e elevada a um outro estado que faça o observador sentir-se em comunhão com o objeto.
· Fora da experiência estética, podemos chegar ao nível da recepção crítica. Para essa tarefa, só a convivência com a obra não basta, é necessário o conhecimento histórico dos estilos e da linguagem de cada arte, além de um profundo conhecimento da cultura que gerou cada obra.
· Logo, a arte é a percepção da realidade na medida em que cria formas sensíveis que interpretam o mundo, proporcionando o conhecimento por familiaridade com a experiência afetiva.
· Entender a idéia de uma obra de arte é mais como ter uma nova experiência.
20.7 – Arte e sociedade:
· A subjetividade de um artista não consiste em que a sua experiência seja fundamentalmente diversa da dos outros homens de seu tempo e de sua classe, mas consiste em que ela seja mais forte, mais consciente e mais concentrada.
· Mesmo o mais subjetivo dos artistas trabalha em favor da sociedade.
· A arte é uma realidade social.
· A arte precisa mostrar o mundo como passível de ser mudado e ajudar a mudá-lo.
EXERCÍCIO PARA CASA:
171) Quais são os principais modos de organização da experiência humana?
172) Por que a arte é um caso privilegiado de entendimento intuitivo do mundo?
173) O que o artista intui?
174) Por que o artista cria símbolos e não cópias da natureza a partir da sua intuição?
175) O que caracteriza os símbolos nas obras de arte?
176) Como são experimentados os dados sensíveis no cotidiano e na arte?
177) Qual é o papel da imaginação na arte?
178) Por que o sentimento é a via de acesso ao acordo entre natureza e sujeito?
179) Qual é a diferença entre sentimento e emoção?
180) O que é a expressão em arte?
181) Como se dá a expressão em arte?
182) O que entra na composição da linguagem da obra?
183) Como pode se dar a educação em arte?
184) Por que é importante a convivência com a obra de arte?
185) Por que precisamos aprender a sentir?
186) Em que nível se situa a recepção crítica da obra e por quê?
20.8 – Funções da Arte:
· As obras de arte, desde a Antiguidade até hoje, nem sempre tiveram a mesma função. Ora serviram para contar uma história, ora para rememorar um acontecimento importante, ora para despertar o sentimento religioso ou cívico.
· Só no século XX é que a obra de arte passou a ser considerada um objeto desvinculado desses interesses não artísticos, um objeto propiciador de uma experiência estética pos seus valores intrínsecos.
· Podemos distinguir três funções principais para a arte: Função pragmática ou utilitária, função naturalista e função formalista.
20.8.1 – Função pragmática ou utilitária:
· A arte serve ou é útil para se alcançar um fim não artístico. Variam muito no curso da história.
· Na Idade Média servia para ensinar os principais preceitos da religião católica e dos relatos bíblicos. Finalidade pedagógica da arte.
· Na época da Contra-Reforma, a arte barroca foi muito utilizada para emocionar os fiéis, mostrando-lhes a grandeza e a riqueza do reino do céu, numa tentativa de segurar os fiéis dentro da religião católica, ameaçada pela Reforma protestante.. Finalidade religiosa da arte.
· No século XX, o “realismo socialista” procurava retratar a melhoria das condições de vida do trabalhador e as principais figuras da revolução socialistas visando despertar o sentimento cívico e manter a lealdade da população, conscientizando-a de sua situação sócio econômica. Finalidade social da arte.
· Os critérios de avaliação da obra de arte nessa perspectiva são o critério moral do valor da finalidade a que serve, ou seja, se for boa, a obra é boa e o critério de eficácia em relação à finalidade, ou seja, se o fim for atingido, a obra é boa.
· Em nenhum momento a obra de arte é encarada do ponto de vista estético.
20.8.2 – Função naturalista:
· São os interesses pelo conteúdo da obra que é encarada como um espelho da realidade, nos remetendo diretamente a ela.
· A obra tem função referencial, assim como uma escultura de Tancredo Neves serviria para nos remeter ao homem e ao político.
· Em segundo plano ficou a leitura propriamente dita da escultura com seus valores técnicos, expressivos, criativos, etc., pois o interesse está voltado somente para o assunto tratado.
· Essa atitude aparece na Grécia do século V a.C., onde essa tendência caracterizou a arte ocidental até meados do século XIX, quando surgiu a fotografia. A partir de então, a função da arte, especialmente da pintura, teve de ser repensada e houve uma ruptura do naturalismo.
· Os critérios de avaliação de uma obra de arte do ponto de vista da função naturalista são a CORREÇÃO da representação e a INTEIREZA, ou seja, a qualidade de ser inteiro e íntegro.
20.8.3 – Função formalista:
· Preocupa-se com a forma de apresentação da obra contribuindo dessa forma com o significado da obra de arte.
· Não importa o tipo de obra analisado, todas comportam uma estruturação interna de signos selecionados a partir de um código específico.
· Há uma valorização da experiência estética como um momento em que, pela percepção e pela intuição, temos uma consciência intensificada do mundo, embora a experiência estética propicie o conhecimento imediato, concreto e sensível do que nos rodeia.
EXERCÍCIO PARA CASA:
187) De que depende a função que a obra de arte tem em cada época ou sociedade?
188) Como a arte é encarada do ponto de vista da função pragmática?
189) Na função pragmática, a que tipos de fins a obra de arte pode servir?
190) Quais são os critérios de avaliação da obra de arte na perspectiva pragmática?
191) Que tipo de interesse pela arte surge na função naturalista?
192) Quais são os critérios de avaliação da obra de arte na perspectiva naturalista?
193) Como a arte é encarada do ponto de vista da função formalista?
194) Quais são os critérios de avaliação da obra de arte na perspectiva formalista?
20.9 – O significado na arte:
· O homem está continuamente atribuindo significado ao mundo. A essa atividade damos o nome genérico de leitura.
· Lemos igualmente outros tipos de textos, não verbais, aos quais também atribuímos significados.
20.9.1 – A especificidade da informação estética:
· A informação estética não é necessariamente lógica, mas pode ou não ter uma lógica semelhante à do senso comum ou da ciência, não precisa ter ampla circulação. Também não pode ser traduzível em outras linguagens, como a verbal ou qualquer outra sem ser mutilada, isto é, sem perder parte de sua significação.
· A informação estética contida em uma obra de arte, pode ser lida de várias maneiras por pessoas diferentes e até por uma mesma pessoa. Na primeira vez em que lemos um livro ou ouvimos uma música, recebemos certa quantidade de informações. Numa segunda leitura ou audição, podemos receber outras informações. Anos mais tarde, ainda outras. Essa característica de inesgotabilidade permite que as obras de arte não envelheçam, não se tornem, ultrapassadas.
· A obra de arte é aberta, no sentido de que ela própria instaura um universo bastante amplo de significações que vão sendo captadas, dependendo da disponibilidade dos receptores.
20.9.2 – A forma:
· Roman Jakobson, lingüista, definiu algumas características da função poética da linguagem e ampliou muito a noção do poético.
20.9.2.1 – A função poética: a transgressão do código:
· A função poética da linguagem, segundo Roman, caracteriza-se por estar centrada sobre a própria mensagem, ou seja, por chamar a atenção sobre a forma de estruturação e composição da mensagem.
· A função poética pode aparecer tanto numa propaganda de outdoor, quanto numa poesia, música ou qualquer outro tipo de obra de arte.
· Como se chama atenção para a própria mensagem?
· Vale ressaltar que a atenção do espectador não se detém na obra ou na mensagem, mas é remetida para o contexto fora da obra.
· Na classificação de Jakobson, a função presente seria a referencial, centrada exatamente no contexto externo à obra. A estruturação da obra, a sua organização interna, não chama a nossa atenção. Para que a estruturação da obra e sua organização interna chamem a atenção do observador, é necessário sair do habitual, daquilo a que estão acostumados e que, por isso mesmo, nem percebem mais.
· É necessário transgredir o código consagrado. Isso é bastante claro na poesia.
· É preciso deixar claro que essas inovações e subversões do código não são gratuitas, não são feitas só para ser engraçadas. Elas contribuem para o significado da obra, neste caso o poema.
20.9.2.2 – O papel das vanguardas artísticas:
· A ênfase dada à forma da obra de arte e às transgressões do código nos leva a examinar o papel das vanguardas artísticas.
· Avant-garde, em francês, é um termo militar que designa o grupo de soldados que avança à frente da guarda ou batalhão.
· Esse termo na área artística e cultural, designa os desbravadores, os que fazem o “reconhecimento do terreno”, os que ampliam o espaço da linguagem artística através de experimentações. É a vanguarda que rompe os estilos, que propõe novos usos do código. Atrás dela vêm os batalhões, ou seja, os outros artistas, considerados seguidores e que formam as escolas.
· Todas essas obras instituem um novo repertório de signos e novas regras de combinação e de uso. Leva algum tempo, e muita convivência com o mundo artístico, para compreender-mos os novos códigos e linguagens.
· A existência das vanguardas, no entanto, é imprescindível à manutenção da fermentação cultural.
· A arte do século XX não é melhor nem pior que a arte grega ou renascentista. É apenas diferente e culturalmente atual.
· Os artistas de vanguarda são exatamente aqueles que levantam essas questões antes que a maior parte da sociedade as tenha percebido e respondem-nas trabalhando a linguagem e a forma sensível de suas obras.
20.9.3 – O conteúdo:
· A interpretação da obra de arte se dá em vários níveis:
· O primeiro nível é o do sentimento. Só pode acontecer na presença da obra.
· O segundo nível se dá através do pensar e envolve análise cuidadosa da obra.
Ø Como se pode fazer essa análise?
Ø Em primeiro lugar, precisamos fazer um levantamento da forma em termos descritivos. Exemplo: A linguagem teatral difere da linguagem cinematográfica. Assim, se formos analisar um espetáculo teatral, vamos precisar, antes de mais nada, saber o que caracteriza a linguagem específica do teatro.
Ø Em segundo lugar precisamos descrever a obra a nível denotativo, isto é, a partir do que realmente vemos ou ouvimos.
Ø Finalmente vamos levantar os significados conotativos de cada signo e dos signos combinados entre si, formando um espesso tecido de significações que se cruzam e entrecruzam. Neste caso precisamos levar sempre em conta a época e o lugar em que a obra foi criada.
· Por exemplo: no Renascimento, o unicórnio simbolizava a virgindade. Se desconhecermos esse fato, a interpretação de uma obra do período em que apareça esse símbolo será deficiente.
· A arte nos traz o conhecimento de um mundo e não somente o conhecimento de uma obra. Instaura um universo de significações que jamais é esgotado e que ultrapassa em muito a intenção do autor. Abaixo o esquema representativo desse processo:
Poema de José Lino Grünewald:
forma
reforma
disforma
transforma
conforma
informa
forma
· É um poema concreto, portanto sua forma visual tem tanta importância quanto à forma sonora. Existe um movimento crescente, seguido de um decrescente e a palavra forma se desloca para a direita até a metade do poema e retorna a sua posição original no fim do mesmo.
· Quanto aos prefixos utilizados, formam um losango, descrevendo o mesmo movimento crescente e decrescente do poema.
· A nível de conteúdo denotativo, temos os significados imediatos das palavras:
ü Forma: os limites exteriores da matéria de que é constituído o corpo, feitio e configuração. Também remete a molde.
ü Reforma: formar de novo, reconstruir, corrigir, emendar, melhorar, aprimorar.
ü Disforma: Dis = separação, negação (da forma); remete a deforma: alterar a forma, perda da forma primitiva.
ü Transforma: dar nova forma, modificar, transfigurar, metamorfosear.
ü Conforma: conciliar, harmonizar, adequar, amoldar, acomodar-se, resignar-se, corresponder.
ü Informa; comunicar, participar.
· A nível de conteúdo conotativo, percebemos que o processo descrito corresponde ao processo de abertura ou ruptura de algo estabelecido, que culmina numa descoberta, numa transformação (processo de crescimento da forma), e termina no estabelecimento de outro molde, isto é, num fechamento.
EXERCÍCIO PARA CASA:
195) Como podemos caracterizar a informação estética?
196) Em que a informação estética difere da informação semântica?
197) Segundo Roman Jakobson o que é a função poética da linguagem?
198) Como se chama atenção para a própria mensagem?
199) Qual é a função das vanguardas artísticas?
200) Por que é difícil entender as obras de arte de vanguarda?
201) O que é interpretar a obra a nível do sentimento?
202) Quais são os passos para se analisar uma obra de arte?
203) Por que a arte nos traz o conhecimento de um mundo?
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